
Satolep é uma bela cidade, fria e úmida, situada no fim do fundo da América do Sul, às margens da Lagoa dos Patos. Suas ruas que avançam para um norte ou um oeste aproximados, terminam no campo; as que vão para um leste ou um sul, num mesmo lento e silencioso rio. Os campos do oeste metamorfoseiam-se, aos poucos, num intrigante conjunto de morros que abriga pedras, cachoeiras e árvores frutíferas. Os campos do norte são grandes latifúndios que o asfalto das estradas federais costura. Atravessando o rio no sentido leste, chega-se ao areião de uma praia; no sentido sul, à uma planície radical...

Compositor, cantor e escritor, gaúcho de Pelotas, o caçula da familia Ramil, irmão de Kleiton e Kledir (lendária dupla da MPB e criadores dos Almôndegas), Vitor Ramil começou sua carreira artística ainda adolescente, no começo dos anos 80, com composições gravadas pelo grupo de seus irmãos.

Aos 18 anos de idade gravou seu primeiro disco Estrela, Estrela, com a presença de músicos e arranjadores que voltaria a encontrar em trabalhos futuros, como Egberto Gismonti, Wagner Tiso e Luis Avellar, além de participações das cantoras Zizi Possi e Tetê Espíndola. Neste período Zizi gravou algumas canções de Vitor, e Gal Costa deu sua versão para "Estrela, Estrela" no disco Fantasia. DOWNLOAD

Deste disco a grande intérprete argentina Mercedes Sosa gravou a milonga "Semeadura".


Neste período não só definiu-se a música e postura do Vitor Ramil dos discos que viriam a ser gravados na segunda metade dos anos 90 como apresentou-se o Vitor Ramil escritor, através da novela Pequod, ficção criada a partir de passagens da infância do autor, de sua relação com o pai, de suas andanças pelo extremo sul do Brasil e pelo Uruguai.
A partir do lançamento deste primeiro livro, em 1995, de grande repercussão junto à crítica e recentemente lançado na França, o artista passou a ocupar-se duplamente: música e literatura.
Mas mais do que pela escritura de Pequod os anos 90 ficaram marcados para Vitor Ramil como os anos em que começou a refletir sobre sua identidade de sulista e sua própria criação através do que chamou de A estética do frio. A busca dessa “estética do frio” deu-lhe a convicção de que o Rio Grande do Sul não estava à margem do centro do Brasil, mas sim no centro de uma outra história. Neste momento, significativamente, ele deixava o Rio de Janeiro para voltar a viver no Sul.
Simultaneamente a Pequod aconteceu a gravação do cd À Beça. Tendo saído apenas como edição especial, em tiragem limitada, por uma revista de música de Porto Alegre, este disco representou seu primeiro esforço de realizar algo a partir das idéias da estética do frio. Com versos leves, cheios de coloquialidade, em melodias fluentes e inusitadas concepções rítmicas, o disco antecipava os dois próximos e mais importantes trabalhos: Ramilonga – A Estética do Frio e Tambong. DOWNLOADEm Ramilonga – A Estética do Frio, gravado em Porto Alegre em 1997, Vitor inaugura as sete cidades da milonga (ritmo comum ao Rio Grande do Sul, Uruguai e Argentina): Rigor, Profundidade, Clareza, Concisão, Pureza, Leveza e Melancolia. Através delas a poesia de onze “ramilongas” percorre o imaginário regional gaúcho mesclando o linguajar gauchesco do homem do campo à fala coloquial dos centros urbanos. A reflexão acerca da identidade de quem vive no extremo sul do Brasil começa pela recusa ao estereótipo do gauchismo. DOWNLOAD
O canto forte dá lugar a uma expressividade sofisticada e suave; instrumentos convencionais são substituídos por outros, como os indianos e africanos, nunca antes reunidos neste gênero de música. Pela contundência de suas idéias, pela originalidade de sua concepção, Ramilonga é uma espécie de marco zero na carreira de Vitor Ramil.
Tambong, seu trabalho seguinte, foi gravado em Buenos Aires, em 2000, sob a produção de Pedro Aznar. Seu resultado é a confirmação da idéia de estar “no centro de uma outra história”, com a musicalidade e poesia brasileiras combinadas com as dos países do Prata a fluir naturalmente em quatorze temas cujos arranjos fazem deste um dos trabalhos mais originais da moderna música brasileira. DOWNLOAD
Tambong saiu em duas versões, português e espanhol. Para realizá-lo Vitor trabalhou com músicos argentinos, como o percussionista Santiago Vazquez, que o acompanha nos shows, e contou com a participação dos artistas brasileiros Egberto Gismonti, Lenine, Chico César e João Barone. DOWNLOAD
Os shows de lançamento de Tambong levaram para o palco a vibração rítmica e as sutilezas harmônicas e melódicas do disco em meio a uma bela produção de luz e cenografia. Começaram com o espetáculo de abertura criado especialmente para o primeiro Forum Social Mundial em Porto Alegre e, depois, foram readaptados para uma temporada de um mês no Rio de Janeiro e outra em São Paulo. Na Argentina o lançamento aconteceu em outubro de 2001, com dois espetáculos em Buenos Aires.
No ano de 2002, com sua banda brasileiro-argentina (Santiago Vazquez, percussão; André Gomes, píccolo bass e sitar; Roger Scarton, harmonium e guitarra) levou Tambong em turnê pelas principais capitais do Brasil.
Em 2003 Vitor apresentou seu primeiro show solo em Montevidéu, Uruguai, Sala Zitarrosa, mesmo local onde tocara, no final de 2002, com o compositor e intérprete uruguaio Jorge Drexler, hoje seu parceiro.
Ainda em 2003 apresentou-se com sua banda na Suíça, nas cidades de Genebra, Zurique e Schaffhouse. Em Genebra, no Teatro St. Gervais, Vitor deu uma conferência, tendo como tema “A estética do frio”. Em Paris, no mesmo período, participou do evento de lançamento da tradução para o francês de seu livro Pequod, pela editora L’Harmattan.
Além de seu livro Pequod, suas canções vem sendo distribuídas na Europa em coletâneas inglesas, espanholas e portuguesas. Sobre Vitor Ramil escreveu o produtor londrino John Armstrong: “Why hasn’t this genious dominated the world of music yet?”Outubro de 2004 é a data de lançamento de Longes, seu sétimo álbum, também gravado em Buenos Aires e produzido por Pedro Aznar. Neste trabalho Vitor Ramil aprofunda e aperfeiçoa a linguagem que começou a elaborar nos trabalhos anteriores, Ramilonga e Tambong. Se em Ramilonga chamava a atenção a unidade em torno de temas e timbres e se a marca de Tambong era a diversidade sonora e poética, Longes pode ser definido como uma síntese dessas qualidades, por mais paradoxal que isso pareça, e um avanço a partir delas. DOWNLOAD
Os arranjos de Longes têm sua base no violão de aço arpejado de Vitor Ramil e nos baixos melódicos de Pedro Aznar. Participam também Santiago Vazquez e Marcos Suzano nas percussões, o baterista Christian Judurcha, o pianista clássico Gabriel Victora, o guitarrista Bernardo Bosísio, a cantora Adriana Maciel, um quarteto de sopros e uma orquestra de cordas.
A apresentação gráfica de Longes traz fotografias feitas por Vitor e sua mulher Ana Ruth em vários países, além de fragmentos de Satolep, romance que Vitor escreveu simultaneamente à criação das canções do disco.Satolep Sambatown é o nome do novo CD de Vitor Ramil, em parceria com o percussionista Marcos Suzano. A dupla criou uma sonoridade diferente, em que instrumentos convencionais se misturam a ‘samplers’ e sintetizadores.
O projeto tem a marca da dupla em tudo. Eles dividem a produção do disco, tocam os instrumentos, experimentam sons e mantêm suas raízes musicais. Essa comunhão é representada até no nome do álbum: “Satolep” é Pelotas (cidade natal de Vitor Ramil) escrita ao contrário, e “Sambatown” vem do primeiro álbum solo de Marcos Suzano, de 1996. DOWNLOAD
O álbum conta com participação de Jorge Drexler e da carioca Kátia B. “Satolep Sambatown” é um disco de experimentações. Nele encontramos um repertório que mistura o samba, o choro e a milonga, ritmo mais conhecido no Rio Grande do Sul, com uma base eletrônica. Tudo isso é novidade na trajetória da dupla, que também se uniu especialmente para esse trabalho.
Texto: adaptado por RR do release original do músico.
Pesquisa: Gustavo Ôcalvo.
>>> Site Oficial
DISCOGRAFIA:
• Estrela, Estrela (1981)
• A Paixão de V Segundo Ele Próprio (1984)
• Tango (1987)
• À Beça (1996)
• Ramilonga – A Estética do Frio (1997)
• Tambong (2000)
• Longes (2004)
• Satolep Sambatown (2007) (com Marcos Suzano)
"Sinto hoje em Satolep
O que há muito não sentia
O limiar da verdade
Roçando na face nua
As coisas não têm segredo
No corredor dessa nossa casa
Onde eu fico só com minha voz
A Dalva e o Kleber na sala
Tomando o mate das sete
A Vó vem vindo da copa
Trazendo queijo em pedaços
Eu liberto nas palavras
Transmuto a minha vida em versos
Da maneira que eu bem quiser
Depois de tanto tempo de estudo
Venho pra cá em busca de mim...
...O que a gente quer é ser feliz
A paz do indivíduo é a paz do mundo
E viva o Rio Grande do Sul!...
...Eu existo em Satolep
E nela serei pra sempre
O nome de cada pedra
E as luzes perdidas na neblina
Quem viver verá que estou ali..."